| Sexta-feira, 12 de agosto de 2005 09h53 Vítima afirma que promotor deu dois tiros de advertência ALEXANDRE HISAYASU da Folha de S.Paulo
Thales Ferri Schoedl, 26, promotor que matou um rapaz e feriu outro em um luau em Bertioga (litoral de São Paulo), em 30 de dezembro do ano passado, durante uma discussão por causa de sua namorada, só passou a atirar contra as pessoas quando elas tentaram tomar sua arma, uma pistola, e depois de dar dois tiros, um para cima e outro para o chão.
A afirmação está no depoimento do sobrevivente dos tiros, o universitário Felipe Siqueira Cunha de Souza, 21. O testemunho foi prestado em 9 de janeiro, em um quarto do hospital Sírio Libanês (centro de São Paulo) ao procurador Álvaro Busana e ao promotor Luiz Roberto Salles Souza.
Esse relato coincide com o dado por Schoedl em depoimento. O promotor, que alega legítima defesa, disse que, após dar dois tiros de advertência, foi perseguido por cerca de 200 metros. Quando ficou encurralado, um rapaz o teria agarrado e ele começou a atirar.
Anteontem, em entrevista à Folha, o estudante de direito contou uma versão diferente. Disse que só depois de levar um tiro no peito, disparado pelo promotor, ele e o amigo Diego Mendes Modanez, 20, correram para tentar desarmá-lo. Por essa versão, Schoedl recuou e atirou novamente, várias vezes. Modanez morreu atingido por dois tiros e Souza ficou ferido após ser baleado quatro vezes.
O promotor fugiu e foi preso horas depois por policiais de Bertioga e aguarda a decisão do processo em liberdade.
"Ele [promotor] deu o primeiro tiro para cima, o segundo para baixo e o terceiro, em mim. Antes do segundo disparo, alguém gritou que a arma era de brinquedo. Eu fiquei parado, no máximo gesticulava. Depois que me atingiu, ele começou a correr. Fui atrás até para me defender também, porque não tínhamos para onde correr. Nunca chegamos perto dele. Era sempre ele correndo e atirando", afirmou o universitário.
O universitário afirma que nem ele nem o amigo morto estavam no grupo de rapazes que teria ofendido a namorada do promotor Thales Ferri Schoedl, uma estudante de 19 anos.
Segundo Souza, ele conversava com Modanez quando ouviu o promotor discutindo com um grupo de jovens. "Ele [promotor] estava bastante alterado e nervoso. Eu e o Diego falávamos para ele ir embora, que não valia a pena ficar discutindo", afirmou.
Naquele instante, segundo o universitário, Schoedl passou a acusá-lo de ter ofendido sua namorada. "Passamos a discutir. Em nenhum momento me dirigi à namorada dele. Ficamos o tempo todo parados. O Thales queria avançar contra nós, mas era seguro pela garota", contou.
O promotor, segundo o estudante, chegou a virar de costas para ir embora, mas voltou a discutir após Souza ter falado que "era melhor ir embora mesmo".
Em seguida, afirma o universitário, o promotor começou a atirar e a correr.
Parcialidade
O advogado do jovem, Pedro Lazarini Neto, afirmou que sentiu "uma certa parcialidade" favorável a Schoedl por parte do procurador Busana e do promotor Salles Souza quando eles foram ouvir o universitário no hospital.
Durante o depoimento, ele conta que teve de "intervir" por três vezes para que as declarações de seu cliente fossem colocadas na íntegra pelo promotor Salles.
Como exemplo, citou o instante em que o universitário disse que Schoedl estava "descontrolado" e Salles Souza digitou "irritado".
Apesar disso, o advogado elogia a atuação do procurador-geral de Justiça, Rodrigo César Rebello Pinho, chefe do Ministério Público de São Paulo. "Ele está investigando o caso com imparcialidade."
O processo contra o promotor, no Tribunal de Justiça, é de homicídio simples, que permite ao réu aguardar a decisão em liberdade.
A situação profissional de Schoedl será definida no próximo dia 31 pelo Órgão Especial do Ministério Público, que pode ratificar ou não a decisão de julho do Conselho Superior, que votou pela exoneração dele do cargo. Se for expulso, ele perde o direito a foro privilegiado e será julgado pelo Tribunal do Júri de Bertioga.
Procurado, Thales Schoedl não quis dar entrevista.
Outro lado
O Ministério Público disse, sobre a acusação do advogado de Felipe Souza de parcialidade, que o depoimento do jovem foi tomado "de forma absolutamente isenta". O procurador Busana e o promotor Salles Souza não quiseram se manifestar.
Anteontem, o procurador-geral de Justiça, Rodrigo César Rebello Pinho, afirmou que houve imparcialidade e que, independentemente do depoimento, "o Tribunal de Justiça recebeu a denúncia. A tese de legítima defesa não foi aceita". "Há depoimentos contrários e favoráveis ao réu. Não quero entrar nessa discussão porque não quero trocar de vítima", disse.
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