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Sexta-feira, 15 de julho de 2005 09h22
DNA dá armas contra Chagas e outros males
REINALDO JOSÉ LOPES
RICARDO BONALUME NETO
da Folha de S.Paulo

Três dos parasitas que mais infernizam as populações pobres do planeta tiveram o conjunto de seu DNA soletrado por um grupo internacional de pesquisadores. É o primeiro passo para descobrir brechas importantes na armadura dos três vilões de uma célula só: Trypanosoma cruzi, causador do mal de Chagas; seu parente T. brucei, responsável pela doença do sono; e Leishmania major, um dos causadores da leishmaniose.

Os estudos que detalham e comparam os genomas das criaturas estão na revista "Science" (www.sciencemag.org) de hoje, e contaram com a participação de diversos pesquisadores brasileiros. Entre as instituições envolvidas estão a UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), USP e Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).

Disponibilizar de uma vez os três mapas genéticos tem uma vantagem: os cientistas já conseguiram comparar as moléculas do trio e descobriram que há numerosos pontos em comum entre eles. Não é impossível, portanto, que o futuro traga um medicamento "guarda-chuva", capaz de matar os três com uma cajadada só.

"Graças a esses estudos, os cientistas estão bem mais próximos de desenvolver remédios eficazes do que estavam cinco anos atrás", afirmou em comunicado oficial Najib El-Sayed, do Instituto de Pesquisa Genômica em Maryland (EUA), que coordenou a decifração do genoma do T. cruzi. Carlos Renato Machado, biólogo do Departamento de Bioquímica e Imunologia da UFMG, preferiu ser mais sóbrio: "É um alicerce. Agora você tem na mão um grande conjunto de dados que precisa ser mais estudado."

Chaga aberta

O causador do mal de Chagas é, de longe, o que mais mete medo. Estima-se que 18 milhões de pessoas estejam infectadas com o T. cruzi. As mortes estariam por volta de 21 mil ao ano, de acordo com a Organização Mundial da Saúde. Não há medicamento conhecido que possa curar a infecção, nem vacinas disponíveis para barrar o parasita, que afeta de forma devastadora órgãos como o coração.

A dificuldade não é por acaso: o genoma mostra que se trata de um participante bizarramente sofisticado do jogo da evolução. Segundo Machado, apesar do genoma, ainda não se conhece com certeza o número de cromossomos (as estruturas enoveladas que abrigam o DNA) da criatura. "Aliás, o número e tamanho dos cromossomos pode variar em diferentes cepas do parasita", completa o biólogo José Franco da Silveira, do Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia da Unifesp, outro brasileiro envolvido no estudo.

A esquisitice não diminui a complexidade do T. cruzi. Estima-se que ele tenha cerca de 12 mil genes (mais ou menos a metade da atual conta para seres humanos), muitos dos quais parecem conter o "código" para a fabricação de proteínas da mesma família, com algumas pequenas variações. "Essa repetição é muito interessante, embora o que ela significa ainda não esteja muito claro", afirma Machado, que trabalhou com Santuza Ribeiro Teixeira, também da UFMG, estudando os genes que o parasita usa para consertar o próprio DNA.

Uma pista sobre isso pode estar nos tipos de gene "multiplicados". Muitos codificam proteínas da superfície das células do parasita, "relacionadas com a virulência [capacidade de causar doença] e evasão do sistema de defesa do organismo", afirma Silveira.

Ou seja, estariam ligadas à capacidade de enganar as células humanas que o T. cruzi precisa invadir para sobreviver. Outros trechos de DNA muito abundantes poderiam ser chamados de "genes-ladroeira". Daniella Bartholomeu, bióloga mineira que faz pós-doutorado com a equipe de El-Sayed nos EUA, explica. "O parasita, por exemplo, não é capaz de sintetizar ácido siálico. Por isso "rouba" essa molécula do hospedeiro", diz Bartholomeu.

As substâncias do T. cruzi e do T. brucei que fazem esse serviço sujo, conhecidas como trans-sialidases, poderão ser alvos de drogas contra eles, conta a bióloga, uma vez que estão presentes nos parasitas mas não nos hospedeiros --ou seja, menos chances de efeitos colaterais. A equipe identificou vários outros alvos potenciais. O obstáculo para torná-los reais, contudo, não é só científico.

Doenças de pobre

"O grande problema nessa área é que o desenvolvimento de drogas não é muito atrativo do ponto de vista econômico para as companhias farmacêuticas", diz Daniella Bartholomeu. Ou seja: doenças que afetam pobres não parecem uma fonte muito promissora de lucros. Mas, ressalva a pesquisadora, "o desenvolvimento de uma droga única capaz de combater os três parasitas seria mais atrativo". É esperar para ver.

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